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Aracaju - Sergipe, Brasil
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A reforma do SUS em Sergipe.


Por:
Flávia Priscila Souza Tenório.
José Francisco de Santana.
Tânia Santos de Jesus

Em 2015 o Sistema Único de Saúde (SUS) completará vinte e sete (27) anos de criação e não podemos nos descuidar em rememorar e comemorar o significado positivo do seu surgimento para a cidadania Brasileira. Tratou-se de um acontecimento tão importante quanto a promulgação da própria Constituição que lhe deu origem. Fazer uma retrospectiva do SUS é revisitar um período efervescente da sociedade, em que significativas mudanças foram empreendidas e que fortaleceram a democracia e a participação cidadã no Brasil.

Conforme sabemos, o SUS instituiu um novo modelo de Sistema Nacional de Saúde, alicerçado na descentralização de ações e serviços e pautado em um modelo de gestão que considera imprescindível a participação popular através dos diversos segmentos representativos.

Não dá para falar no surgimento do SUS sem referir a VIII Conferência Nacional de Saúde (CNS), realizada em 1986, ocasião em que técnicos do setor de saúde, estudantes, intelectuais, sindicatos, e tantos outros setores da sociedade organizada disseram basta a um sistema de saúde curativista, desresponsável e excludente que vigorava até então. A VIII CNS é considerada um referencial para o movimento sanitário brasileiro, bem como para a política de saúde, uma vez que propôs um modelo de proteção social com garantia do direito à saúde, estabelecendo a saúde como um bem supremo de direito universal.
Mas não podemos esquecer que a Reforma Sanitária Brasileira, que resultou no surgimento do SUS, demandou uma nova forma de pensar a gestão da saúde, principalmente a partir da mudança do enfoque curativista para prevencionista, mediante atribuição de valor equivalente aos aspectos biológicos, psíquicos e sociais do adoecimento humano. E essa determinação de mudança de paradigma praticamente impôs aos trabalhadores do campo da saúde uma revisão dos seus próprios conceitos acerca do processo saúde-doença, na perspectiva da redução da importância do modelo biomédico vigente.

A partir de então, os gestores da saúde, os demais trabalhadores do setor saúde e a própria sociedade passaram a ter que aprender a interagir com o sistema de saúde descentralizado, pautado em princípios e diretrizes que devem ser reproduzidos em todo território nacional, com ênfase na esfera municipal, e cujo arcabouço legal básico são as Leis nº 8.080, de 19 de setembro de 1990 e 8.142, de 28 de dezembro de 1990 além, claro, da Constituição Federal de 1988 que, no Capítulo da Seguridade Social, assenta em seu Artigo 196 "a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação".

Sobre os preceitos que fundamentam o SUS é evidente o caráter ideológico dos princípios doutrinários (universalidade, equidade e integralidade) e eles têm a finalidade de garantir o direito à saúde, necessitando-se para isso a conformação e implementação do sistema de saúde. Já os princípios organizativos (descentralização, regionalização, hierarquização e participação social) traduzem o desejo e a necessidade da capilarização do SUS em todo o território nacional, sob o olhar atento da sociedade, através da efetiva participação nas instâncias de Controle Social.

A partir do princípio da Universalidade, o SUS garante o acesso igualitário às ações e serviços de saúde por parte dos cidadãos, sem previsão de qualquer forma de exclusão ou discriminação. Já o princípio da Equidade pode ser resumido na finalidade de tratar os desiguais de modo desigual, na medida de suas necessidades, minimizando dessa forma, as iniquidades.

O princípio da Integralidade busca o atendimento das necessidades dos usuários do SUS nos diversos níveis de assistência, estimulando a integração entre políticas públicas, de modo que a saúde seja pensada de forma integral, favorecendo a promoção, prevenção, tratamento, cura e reabilitação.

A descentralização pode ser entendida como uma estratégia dos princípios organizativos que tem por finalidade a redução das desigualdades sociais e regionais, com vistas a tornar maior e mais rápida a resolutividade, à medida que proporciona que o poder de decisão esteja mais próximo do problema. Através da descentralização da gestão e mediante a redefinição das responsabilidades dos níveis de governo, a nação, os estados e os municípios têm a possibilidade e o dever de pensar a política de saúde na sua esfera de competência e o resultado esperado é a melhoria da resolutividade dentro do setor saúde.

No intuito de racionalizar o sistema e otimizar o uso de recursos financeiros, a regionalização e a hierarquização dos serviços são estratégias organizacionais essenciais que se configuram através da delimitação territorial, cujo limite é o município, e da divisão político-administrativa de bases territoriais, o que favorece a organização racional da oferta de serviços e ações de saúde. É a partir desses princípios, também, que se orienta a organização das unidades produtivas de saúde, de acordo com o grau de complexidade tecnológica dos serviços e a partir de indicadores epidemiológicos.

Quando o arcabouço legal do SUS condiciona a implantação e implementação desse sistema de saúde à participação popular, espera-se que esta participação ocorra de forma efetiva e democrática, com o cidadão utilizando-se de fóruns adequados de intervenção no rumo das políticas públicas de saúde, seja na esfera federal, estadual ou municipal. Entretanto, ainda precisamos questionar se na nossa sociedade há, efetivamente, espaços de participação popular e decisão coletiva.

Preocupado em adequar o SUS à realidade regional, o Estado de Sergipe promoveu uma profunda “Reforma Sanitária e Gerencial” e o marco foi o ano de 2008, ocasião em que o Poder Legislativo Estadual aprovou um pacote de leis que repaginaram a administração pública no Estado. Com uma população de, aproximadamente, dois milhões de habitantes à época distribuída entre setenta e cinco municípios foi, sem dúvida, o principal projeto para a área da saúde do governo estadual na ocasião e consistiu na definição do papel do Estado na gestão como produtor de serviço complementar aos municípios, indutor de políticas e coordenador de sistema, assentado sobre os princípios e diretrizes norteadores do SUS.

A seguir são relacionadas as Leis que deram sustentação e possibilitaram a Reforma Sanitária e Gerencial do SUS em Sergipe:
  • Lei Nº 6.299 - institui o Prog. Est. de Parcerias Público Privadas de Sergipe (PROPPPSE).
  • Lei Nº 6.300 - cria o Conselho Estadual de Saúde.
  • Lei Nº 6.303 - dispõe sobre o Fundo Estadual de Saúde.
  • Lei Nº 6.341 - dispõe sobre Contrato Estatal de Serviços.
  • Lei Nº 6.345 - dispõe sobre a organização e funcionamento do SUS em Sergipe.
  • Lei Nº 6.346 - dispõe sobre a criação da Fundação de Saúde Parreiras Horta (FSPH).
  • Lei Nº 6.347 - dispõe sobre a criação da Fundação Hospitalar de Saúde (FHS).
  • Lei Nº 6.348 - dispõe sobre a criação da Fundação Estadual de Saúde (Funesa).
Uma das providências basilares da reforma em Sergipe foi a definição de um “padrão de integralidade” para o SUS estadual com listas públicas de acesso aos serviços, sem intermediação política. Também foram definidas e formalizadas as responsabilidades de cada ente federado na gestão compartilhada do sistema de saúde, através de assinatura de um expediente denominado Contrato de Ação Pública (CAP), o que colaborou para a abertura de intenso debate sobre judicialização da saúde, uma vez que através do CAP ficou estabelecido o que o SUS de Sergipe iria ofertar e as responsabilidades dos municípios, Estado e União para a manutenção do “padrão de integralidade”. 
 Ao destacar a integralidade como centro do processo e considerar as condições históricas e sócio-econômicas de cada lugar para conformar redes de atenção à saúde, a Reforma Sanitária e Gerencial de Sergipe respeitou a descentralização dos serviços para além dos limites territoriais dos municípios, de acordo com a capacidade de financiamento das prefeituras e do Estado.
Para viabilizar a reforma sanitária estadual o governo precisou implementar as seguintes estratégias: 1) Reorganização do Controle Social; 2) Criação de três Fundações Estaduais; 3) Regulamentação da Emenda Constitucional 29; 4) Reforma Administrativa e Gerencial; 5) intensificação de ações de Formação e Educação Permanente em Saúde. Nesse sentido, modelos jurídico-institucionais para o gerenciamento da rede de serviços de saúde foram criados e colegiados interfederativos foram regulamentados para funcionar como instâncias de pactuação e consenso na operacionalização da rede de serviços. Assim, a partir de consensos interfederativos e dos Contratos de Ação Pública que passaram a ser firmados entre o Estado e municípios, estabeleceram-se as responsabilidades, os direitos, as obrigações, e o financiamento da rede de serviços.

Percebe-se que a Reforma Sanitária e Gerencial do SUS de Sergipe destacou o Estado no seu papel de principal protagonista na gestão do sistema e enquanto provedor dos serviços complementares. Ela foi um marco para a saúde pública porque tornou viável a descentralização dos serviços, respeitando a capacidade financeira dos municípios e do próprio Estado e teve como foco os usuários dos serviços de saúde, buscando ofertar ações com base nos princípios e diretrizes que norteiam o Sistema Único de Saúde.


REFERÊNCIAS

FUNESA – Fundação Estadual de Saúde. A Reforma Sanitária e Gerencial do SUS no Estado de Sergipe. Secretaria de Estado da Saúde de Sergipe – Aracaju: FUNESA, 2011.

SANTOS. Lenir; CARVALHO. Rogério. O SUS no Estado de Sergipe: uma reforma corajosa. Disponível em: http://www.idisa.org.br/img/File/SUSSergipe.pdf. Acessado em 26/02/2015.

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